Não basta dizer que se importa
- Gisele Fontes
- 12 de fev. de 2019
- 3 min de leitura
Ontem o Comuna Diversa compartilhou dois blocos de uma matéria norte americana sobre a experiência das moradias para pessoas com TEA. O ponto central da abordagem foi a percepção de que é necessário mudar o mundo, hostil, para que seja garantido o direito das pessoas à existência plena em cidadania.
E nos restou então a questão - é possível mudar o mundo? Acompanhada da questão subjacente - iniciativas individuais ou de pequenos grupos, são aptas a mudar o mundo?
A princípio entendemos que não há mudança coletiva sem que os pressupostos da opressão sejam questionados. Sabemos que todas as lutas de todas as minorias têm como pano de fundo comum a necessidade de transformação das estruturas sociais. A luta contra o racismo encontra seu pano de fundo no racismo estrutural, assim como a luta feminista o encontra no patriarcado, assim como a luta contra o capacitismo encontra seu pano de fundo no padronização da “normalidade” e assim por diante com todas as minorias oprimidas. Não há, de fato, como tentar por fim aos efeitos negativos de uma sociedade excludente e opressora sem ao menos denunciar que a exclusão e opressão são pressupostos do modelo econômico vigente, mantendo-o livre de críticas, preservando de questionamentos o próprio modelo econômico e social que produz tanta exclusão e tanta opressão.
Mas, mesmo quando não há tais questionamentos, as ações individuais ou coletivas de pessoas que buscam interferir voluntariamente em um contexto ou grupo social, para resolver questões pontuais, não deixam de ser interessantes. Esse voluntariado é hoje conhecido como Empreendedorismo Social e pretende solucionar questões específicas resultantes da exclusão e opressão contra grupos sociais.
Fruto da empatia de pessoas que querem contribuir com o outro, o Empreendedorismo Social é, por muitas vezes, o resultado de uma visão pragmática e esperançosa de pessoas que querem transformar o mundo. Mas nem sempre. É também muito comum que pessoas se beneficiem de projetos tidos como Empreendedorismo Social para capitalizar os benefícios individuais deles resultantes, quer sejam benefícios financeiros, quer sejam benefícios extrapatrimoniais.
E como identificar quem apenas pretende usar em benefício próprio a opressão e exclusão sofrida por outros, distinguindo-os de quem realmente deseja agir por empatia e compromisso com o outro?
O documentário “Quem se Importa?” De Mara Mourão, nos traz algumas pistas. Deixando de lado alguns apelos emotivos presentes no documentário, como a música incidental e as imagens de passarinhos voando, por exemplo, além do encantamento pela voz de Rodrigo Santoro como narrador, o documentário nos apresenta algumas pistas para reconhecer um Empreendedor Social que de fato está movido pelo compromisso do benefício coletivo.
Por exemplo nos trechos abaixo:










É importante pra nós que saibamos distinguir quem de fato quer mudar o mundo. E essa dica dada pelo documentário, é muito perspicaz - devemos ficar atentos aos “donos de ideias”, de projetos que os mesmos não autorizam o livre replicamento. Essa já é uma boa regra de prudência para o início da observação.
Uma outra regra de prudência é percebermos os equívocos em afirmações como esta:
“Os transformadores inovam porque têm um olhar fresco, livre de dogmas, partem do princípio de que todos têm capacidades e conseguem liberar o potencial humano entre indivíduos que antes eram vistos como deficientes, incapazes, irrecuperáveis” nos diz Rodrigo Santoro lá pelo minuto 1:13 do documentário.
Nós apenas observamos que não é o transformador que libera potencial de ninguém. Ele, o transformador, é apenas a pessoa que não reproduz muitos dos obstáculos atirados diariamente sobre as pessoas com deficiência, tidas como incapazes e irrecuperáveis para uma sociedade capacitista.
Não deixe de assistir ao documentário completo no Canal do Comuna Diversa no YouTube.
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