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Cobertura do primeiro dia do V Congresso Ibero-americano sobre síndrome de Down

  • Gisele Fontes
  • 29 de abr. de 2019
  • 10 min de leitura

Com um público de mais de 500 pessoas e a presença de 19 países Ibero-Americanos, foi aberto às 09:00 h da manhã desta segunda feira, 29 de abril, o do Congresso Iberoamericano sobre síndrome de Down. A abertura foi marcada pela explanação de Augustín Matía, Gerente da Federação Down España, cuja fala teve como tema “O que mudou nos últimos 10 anos para as pessoas com deficiência intelectual?

Após a participação de Agustín Matía, o V Congresso Íbero-Americano sobre síndrome de Down foi oficialmente aberto pelas autoridades protocolares. Sra. Hilda Gutierrez, representando o Governo Colombiano; Sra. Alba Luz Pava, Coordenadora do programa “Escola Inclusiva” da Secretaria de Educação de Cartagena; Sr. Marcelo Varela, Presidente da FIADOWN; Sra. Claudia Ritzel, Presidente da FUNDOWN Caribe; Sra. Monica Cortés, da ASDOWN Colômbia e Cristina Vélez, autodefensora falando pela FUNDOWN Caribe e ASDOWN Colômbia.

Após o breve intervalo para o café, no meio da manhã, o Presidente da FIADOWN, Marcelo Varela, apresentou a situação da efetividade das garantias contidas na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência nos países íbero-americanos nas áreas de educação, saúde, trabalho, autonomia e vida independente. Ao final, as conclusões gerais foram sintetizadas pelo palestrante no rol abaixo:

- Ainda na Iberoamérica, particularmente na América Latina, há muito trabalho por fazer; - Devemos destacar o tema cognitivo, a observação tem mostrado que a chave está lá; - É fundamental trabalhar com as famílias para empoderá-las, as famílias devem atuar menos individualmente e mais coletivamente, se queremos que a sociedade avance em incluir as pessoas com sd; - O trabalho das Associações locais é chave, e a união na Federação cria um modelo de pressão difícil de se obter de forma isolada; - Nossos filhos nos mostram que quando lhe damos oportunidades e acreditamos neles, não há limites.

Após a explanação de Marcelo Varela, teve início a apresentação de Ignacio Calderón, Doutor e Professor de Teoria e História da Educação na Universidade de Málaga, na Espanha, com o tema “Educação inclusiva, melhor para todos”. O especialista iniciou sua apresentação celebrando o fato de que no dia de ontem, 28 de abril de 2019, o cidadão espanhol com síndrome de Down exerceu pela primeira vez o seu direito ao voto, direito este reconhecido durante a legislatura espanhola anterior. Ignacio Calderón apresentou o que chamou de “cartografia” da segregação, fazendo em seguida referência à meta análise publicada em 2016 pela Universidade de Harvard, de autoria do Dr. Thomas Herir e outros e publicada no Brasil pelo Instiruto Alana, em que foram analisados dados de 280 pesquisas sobre o tema da educação em 25 países. Dr. Ignacio Calderón afirma que esta publicação é a comprovação científica definitiva de que a educação inclusiva beneficia a todos na comunidade e não apenas às pessoas com deficiência. Em seguida, abordou a objetificação dos seres humanos como um ataque à humanidade e demonstrou como a Pedagogia do Oprimido, de Paulo Freire, nos permite entender o processo opressivo de construção da ideia de diferença, onde está a solução para esta questão que tanto prejudica as pessoas com deficiência intelectual, nos ajuda a entender a objetificação do indivíduo e, o mais importante, como reagir a isso.

Saúde, o tema de painel mais votado em nossa enquete no Instagram!

A primeira palestra do bloco de palestras de saúde que ocorreram na tarde de hoje foi do Dr. José Maria Borrel Martínez, que é Coordenador do Comitê Científico d FIADOWN e Assessor Médico da Down Espanha e tem larga experiência com elaboração de protocolos de saúde para pessoas com síndrome de Down, sendo co-autor do “Programa Espanhol de Saúde para pessoas com síndrome de Down” dos anos de 1993, 1999, 2004 e 2010) e co-autor e coordenador del “Programa Iberoamericano de saúde para pessoas com síndrome de Down” de 2015. Dr. José Maria Borrel Martínez também é o Coordenador dos Guias Médicos por especialidades da Down Espanha. Em sua palestra, apresentou o Programa Íbero-americano de saúde para pessoas com síndrome de Down, que pode ser consultado na página da FIADOWN, neste link.

O especialista explicou que o programa ibero-americano é uma adaptação ampliada do programa espanhol, passando a detalhar todos os pontos do protocolo e destacando quatro aspectos muito importantes sobre o mesmo. O primeiro, sobre a urgência dos Associações filiadas à FIADOWN pressionarem os governos locais para o cumprimento deste protocolo. O segundo, sobre o papel da família nas questões de saúde, o terceiro, sobre a essencialidade da prevenção e o quero, sobre o calendário de vacinas para pessoas com síndrome de Down proposto no Programa, que deve ser flexibilizado para atender às especificidades de cada país, sem, no entanto, que se perca de vista a existência da imunodeficiência associada à síndrome de Down.

A segunda palestra de saúde da tarde de hoje, cujo tema foi “Cuidados de saúde na vida adulta, para um bom envelhecer”, foi proferida pelo Dr. Gonzalo Berzosa Zaballos, que é Diretor da Escola de Famílias e Deficiência da Down Espanha e Fundação MAPFRE. O especialista ressaltou que saúde não diz respeito apenas ao aspecto biomédico, mas sim a uma compreensão integral do ser humano, em seu aspecto psicológico, relacional e social.

Destacou que envelhecer bem é um processo social, pois, significa que o entorno que rodeia a pessoa, a apoia e contribui para a manutenção da sua saúde biopsicosocial. Envelhecer bem implica que haja políticas públicas de saúde, suporte econômico, bem estar social, saúde física e psíquica. Chamou atenção para o quanto os adultos com síndrome de Down estão envelhecendo em isolamento, em um processo de invisibilização reforçado pela própria comunidade, que os oculta, usando como exemplo o calendário produzido por tantas associações em diversos países, onde os meses do ano são ilustrados unicamente por crianças e jovens. Enfatizou que é necessário informar e preparar a pessoa com síndrome de Down para as mudanças naturais da vida (como a morte dos pais, o casamento dos irmãos etc) e para o envelhecimento. E por fim relacionou três recursos que as famílias devem usar para o bom envelhecimento da pessoa com síndrome de Down: autocuidado, atividade física e relações sociais.

O segundo bloco de palestras do tema de saúde na tarde do primeiro dia do V Congresso Ibero-americano sobre síndrome de Down contou com uma série de três palestras temáticas sobre terapias. Em todas as palestras, o enfoque é o mesmo, a constatação de que o cotidiano das pessoas com síndrome de Down está sendo submetido a um excesso de terapias e as decisões de natureza familiar estão sendo tomadas cada vez mais por terapeutas. Em uma analogia à expressão “medicalização”, os especialistas têm cunhado a expressão “terapialização da vida”. Não houve qualquer crítica às estimulações precoces nem a qualquer tipo de estimulação, bem como não houve qualquer consideração sobre os efeitos positivos da estimulação por toda a vida. A questão colocada pelos profissionais deste Painel disseram respeito ao excesso de terapias e ao entendimento destas como via principal de estimulação, o que minimiza o tempo disponível para a interação social, convívio e familiaridade com os contextos sociais e a construção da identidade intersubjetiva enquanto membro de sua comunidade.

A primeira a falar foi a colombiana Astrid Eliana Cáceres, Mestre em Educação e Desenvolvimento Comunitário e membro da ASDOWN Colômbia, que afirmou que “o desenvolvimento das crianças com deficiência é significativamente melhor em ambientes de estimulações permanentes e socialmente naturais, ou seja, avançam com mais segurança e rapidez em contato com pares da mesma idade. Ao mesmo tempo, compreendem as dinâmicas da sua comunidade, para que possam incorporar reações e ambientes, o que favorece a inclusão na educação formal e na vida social e familiar no presente e no futuro.” A especialista entende que a manutenção da criança em uma dinâmica terapêutica prejudica a inclusão e que nossa resposta a isto deve ser o fortalecimento do tecido social em cada comunidade.

Em continuação ao painel sobre terapias, o segundo expositor a falar foi Augustín Matía, gerente da Down Espanha, que iniciou a sua fala fazendo a distinção entre o entendimento das terapias como estratégias que se voltam para a condição da deficiência e que apenas reproduzem o enfoque médico e seu paradigma de cura e reabilitação, e o entendimento das terapias no novo paradigma social, que se dirige à situação de deficiência, um enfoque mais dirigido ao desenvolvimento humano, ao desenvolvimento da potência das pessoas com deficiência, conferindo-lhes poder para que exerçam eficazmente suas vidas. A. Matía propõe um enfoque que evita a ideia de que se busca a transformação da pessoa em termos de “melhora de sua condição”. A abordagem da atenção precoce tem como ponto de partida a forma como atuamos com as famílias vulnerabilizadas, que no momento de crise, choque e afetação, se agarram a qualquer solução mágica que lhes seja apresentada, especialmente com a urgência em tomar decisões rapidamente. E isso explica porque as família estão novamente tão submetidas aos aspectos negativos do excesso de terapias. Ademais, a deficiência é um fator que rompe com os termos em que consideramos a dignidade inerente à pessoa humana. Por fim, o capital social das famílias são seus filhos, por isso a eles se destinam os investimentos. Todas essas questões atuam sobre as famílias em termos de pressão pela busca de um filho perfeito. O palestrante propõe que submetamos as propostas terapêuticas à demonstração de evidência científica que as fundamente. Geralmente quando os resultados prometidos não são alcançados, se inicia a culpabilização das famílias, porque é uma forma de mantê-las sob controle. E os mecanismos de culpabilização das famílias são tão fortes que garantem gastos elevados, de uma forma irracional, incompatível com o curso natural da vida. O especialista recomenda às famílias que desconfiem de soluções magistrais, busquem referências em outras famílias e nos âmbitos universitários, porque a terapialização da vida está estafando muitas famílias, vulnerabilizando-as.

A última palestra do Painel sobre terapia da tarde do primeiro dia do Congresso foi de Ana Kerguelen, Diretora de Formação Avançada na Universidade Pontifícia Bolivariana da Colômbia, que iniciou apresentando dados arqueológicos que comprovam que na pré história pessoas com deficiência que chegaram à vida adulta utilizavam ferramentas de apoio à vida diária, o que demonstra que o cuidado com o outro tem acompanhado a história do ser humano. Em seguida a especialista apresentou a ideia de que o nascimento de um filho com deficiência coloca a família em um vórtice que se caracteriza por três pontos, um redemoinho impetuoso, uma mescla de sentimentos muito intensos e uma confusão que não nos permite ver as coisas com clareza. Este vórtice nos leva à pergunta sobre que caminho percorrer, o que por sua vez nos leva à estimulação adequada - o que vamos fazer, onde vamos fazer, que profissional, que modelo de intervenção etc. E a partir daí se estabelece uma rotina diária de terapias que se estende ano após ano e a grande pergunta que temos que nos fazer como pais é, quando vamos encerrar o ciclo terapêutico? Entendemos que os ciclos de desenvolvimento têm seu tempo e, para cumprir esse tempo, pensamos que atividades terapêuticas 365 dias no ano e de segunda a domingo podem ajudar, porém, as terapias não são equivalentes ao desenvolvimento. Por mais terapias que façamos e por mais recursos financeiros que dispensemos, os ritos de desenvolvimento vão seguir seu próprio tempo. Seis pontos trazem ruído ao processo de desenvolvimento - os processos de estimulação adequada são aqueles que estão aliados aos contextos, proporcionando competência intercultural; o controle do processo deve ser da família e não de terceiros; há ruído quando o desenvolvimento está centrado no terapêutico; o reforço ao desamparo; o sobre-esforço econômico que esgota as famílias e a busca incessante pela perfeição. A resposta para esses ruídos está em três pontos - correr riscos e por um fim aos ciclos, como o ciclo terapêutico. Porém, muitos terapeutas coisificam nossos filhos e crêem que nossos filhos são suas propriedade e que não sabemos o que é melhor pra eles, então temos que correr os riscos de encerrar este ciclo. Também precisamos aprender a viver no caos, todos vivem no caos, um filho com deficiência é apenas outro tipo de caos. E, por fim, temos que encontrar gosto no caos cotidiano das nossas casas e isso implica em afrontar. Temos que encontrar um horizonte de sentido. Não podemos viver a condição da deficiência às secas. Temos que encontrar quem enriquece nosso produto vital e temos que reconhecer quando o vemos transformado. Que os recursos pessoais da família se enriqueceram e reconhecer essa transformação em nós mesmos. Temos que pensar criticamente sobre a rotina que nos provoca vazio, que desumaniza, uma rotina que pensamos em instaurar em nossas casas em razão da condição de deficiência de nossos filhos, que não enriquece a alma e a alma não podemos pensar em deixá-la pelo caminho. Todo aprendizado tem que ser funcional. Temos que pensar se o esforço que estamos fazendo pela estimulação adequada faz sentido para a inclusão. O esforço para a estimulação precoce e adequada tem um horizonte que não se esgota nos primeiros anos, é um horizonte de 60/70 anos, que é a expectativa de vida da pessoa com síndrome de Down, por isso as decisões sobre a estimulação adequada devem ser coentradas no filho/filha e também na família, deve priorizar a autonomia e a autodeterminação e deve contar não apenas com os recursos familiares mas também com os recursos locais, da comunidade em que vivemos. Por meio de votação ocorrida nas redes sociais, a comunidade pediu que no primeiro dia do V Congresso Ibero-americano fosse feita a cobertura do eixo temático de saúde e por isso assim o fizemos. Tendo cumprido com a tarefa que nos foi atribuída pelos seguidores, trazemos agora algumas conferências dos outros temas, começando pelo Painel “Estratégias de aula que promovem a educação inclusiva”, o primeiro painel do eixo temático de educação. Foram três conferencistas neste painel e veremos aqui a palestra do Dr. Ignacio Calderón, professor da Universidade de Málaga.Para Ignacio Calderón, falamos de Educação Inclusiva quando todas as crianças, sem distinção, podem estar, aprender, participar e aprovar, juntos. Esta é a grande ideia, o grande projeto revolucionário para pensar a escola. Para que isso ocorra, temos que pensar na estrutura da escola, que até então esta desenhada de forma muito excludente. Quando dizemos que queremos que a escola seja Inclusiva, o que dizemos é que devemos fazer da escola um espaço de democracia, em que todas as pessoas, independente de sua condição, possam estar, participar e aprender juntos. Para pensar em como fazer da escola um espaço para todas as crianças, há três grandes níveis. Um é um nível estrutural, a escola como estrutura, como instituição, pretende que todas as crianças aprendam o mesmo, da mesma maneira, ao mesmo tempo e evoluam em sua aprendizagem da mesma maneira. Esse projeto homogeneizador deve ser invertido, pois há muito mais diferenças entre os seres humanos que similaridades. O segundo é o nível relacional. Se trata de reconhecer nossos próprios privilégios, humanizando as relações Cada vez que falamos sobre deficiência, estamos falando de desigualdade, então temos que pensar em como transformar essa desigualdade. Somos nós os agentes ativos que provocamos e mantemos essa desigualdade, porque temos privilégio por nos autodenominarmos normais, a respeito das pessoas a quem chamamos de deficientes. Esta relação tende a ser mascarada como neutra. A terceira dimensão é a pessoal, que tem a ver com o reconhecimento negado às emoções, às relações, à condição do corpo, à vontade, ao desejo. Na realidade, estamos falando de aprendizagem, participação e êxito. Sobre a aprendizagem temos que pensar se a escola está promovendo aprendizagem significativa e relevante para todas as crianças. As escolas, todavia, tendem a pensar que a aprendizagem se mede pela aprovação nos exames, mas isso é uma falácia, pois os exames muitas vezes tratam de aprendizado sem significado. O aprendizado deve ser significativo é relevante. O projeto escolar deve proporcionar capacidade crítica a todas as crianças. Quanto à participação, esta deve permear as relações sociais na escola, em particular nas aulas, como condição para que o aprendizado seja significativo e relevante. Por fim, o êxito. Na escola inclusiva, todas as pessoas têm que poder ser reconhecida na escola e este reconhecimento supõe ser aprovada(o) e diplomada(o).

 
 
 

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