Ninguém é normal. A otimalidade na neurociência clínica é um mito, dizem cientistas de Yale.
- Gisele Fontes
- 19 de dez. de 2018
- 3 min de leitura

Os pesquisadores Avram J. Holmes e Lauren M. Patrick, da Universidade de Yale, em publicação de março de 2018 sobre transtornos mentais e padrão de normalidade (padrão ótimo/normal), concluíram que:
“Implícito nas modernas teorias dimensionais da doença psiquiátrica está a suposição de que a variabilidade populacional e a vulnerabilidade da doença são construções intercambiáveis.
Evidências crescentes sugerem que a variação saudável é onipresente em populações naturais e deve ser interpretada em termos de compensações de custo-benefício.
As doenças psiquiátricas surgem através de uma rede de interações que ligam a função cerebral, o comportamento e uma vida inteira de experiências. A pesquisa sobre a etiologia da doença só progredirá através da coleta de conjuntos de dados abrangentes em nível fenômico.
Esforços de colaboração em larga escala começaram a gerar amplas baterias fenotípicas que abrangem fatores ambientais e contextuais, estrutura e função do cérebro, bem como múltiplos domínios de cognição, comportamento e genética. Esses conjuntos de dados têm grande potencial para pesquisadores clínicos que buscam mapear links entre diversos estados neurais e cognitivos.
Evidência clara suporta uma visão dimensional da doença psiquiátrica. Nesse contexto, a expressão de fenótipos relevantes para a desordem é freqüentemente interpretada como um colapso ou afastamento da função cerebral normal. Por outro lado, a saúde é reificada, conceituada como possuindo um único estado ideal. Nós desafiamos esse conceito aqui, argumentando que não há um perfil universalmente ótimo de funcionamento cerebral. As forças evolutivas que moldam nossa espécie selecionam para uma diversidade impressionante de comportamentos humanos. Para apoiar nossa posição, destacamos a variabilidade generalizada no nível da população em redes funcionais de grande escala e circuitos discretos. Propomos que, em vez de examinar os comportamentos isoladamente, as doenças psiquiátricas possam ser melhor compreendidas através do estudo dos domínios de funcionamento e dos padrões de variação multivariados associados aos sistemas cerebrais distribuídos.”
Há muito o que extrair desta conclusão, desde a afirmação de que variação de comportamentos está naturalmente presente em todas as sociedades, até a observação sobre a associação do conceito de saúde com a ideia de um “padrão ótimo/normal” de comportamento cerebral.
No entanto, talvez a conclusão mais relevante seja a afirmação de que a evolução nos direciona para a diversidade e não para a padronização - as forças evolutivas que moldam nossa espécie selecionam para uma diversidade impressionante de comportamentos humanos, dizem os autores.
Isso significa que nós, enquanto espécie, somos seres comprovadamente diversos. E por essa razão a ideia de padronização, de normalidade, não é um dado da natureza e sim uma construção social, razão pela qual é denominada de “mito” pelos autores.
E como seres diversos, seguiremos ampliando nossa diversidade, apesar dos testes genéticos que visam a nossa padronização através da seleção de fetos “perfeitos/saudáveis/ótimos/normais” e mesmo que ainda estejamos travando uma luta árdua para que a diversidade seja reconhecida como valor humano fundamental.
Descrição da imagem: Os Operários, de Tarsila do Amaral. Pintura em óleo sobre tela datada de 1933, com dimensão de 150 cm x 250 cm, onde aparecem ao fundo alguns prédios e seis chaminés de fábricas e à frente, dezenas de rostos de pessoas de várias etnias, tons de pele, ambos os gêneros e inclusive o rosto de uma mulher com véu, sugestivo de diversidade religiosa. Os rostos formam uma multidão.
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