A maioria das pessoas com síndrome de Down tem distúrbios do sono. E há o que ser feito para resolve
- Rogério Lima
- 17 de dez. de 2018
- 4 min de leitura

O período do sono é essencial para manter o equilíbrio de todos. Uma noite mal dormida promove cansaço, letargia, irritabilidade e dificuldades de diversas ordens.
Há muitos estudos correlacionando distúrbios do sono com problemas de fala, baixo crescimento, alterações comportamentais, baixo desempenho cognitivo entre outros fatores negativos do desenvolvimento global.
As pessoas com síndrome de Down (SD), comprovadamente, frequentemente têm distúrbios respiratórios do sono. Em geral as pesquisas mostram índices elevados, em torno de 50 a 75%, o que contribui para uma série de questões comportamentais e cognitivas que são atribuídos à própria síndrome, como característica, sem que se identifique a sua origem. Portanto, é essencial avaliar a qualidade do sono de qualquer pessoa com síndrome de Down. A diretriz pediátrica americana recomenda que todas as crianças com SD realizem o estudo do sono aos 4 anos de idade. Há muitas pesquisas internacionais que avaliaram a qualidade do sono de pessoas com SD e apresentam como conclusão a necessidade de avaliação da qualidade do sono. Infelizmente, a diretriz Pediátrica Brasileira ainda não postula como recomendação o estudo do sono e precisamos insistir na sua realização. Por desconhecimento das especificidades da pessoa com SD e das possibilidades de intervenção, muitos profissionais de saúde apresentam uma enormidade de problemas que impediriam a realização do exame, como (e principalmente) a falta de colaboração da criança, haja vista que terá que permanecer uma noite sob uma grande quantidade de eletrodos em um ambiente diferente da sua rotina. Adicionalmente, vem a afirmação de que se o exame apontar por apneia do sono, dificilmente o paciente aceitará fazer uso de um aparelho de pressão positiva de oxigênio (como o CPAP e o BIPAP) durante as noites. Nestas falas pesa não apenas a falta de conhecimento das especificidades das pessoas com SD como também o desconhecimento das atuais possibilidades de intervenção. Pessoas com SD possuem anatomia específica que dificulta a entrada de ar pela via aérea superior, como as características craniofaciais, palato ogivado, além de hipoplasia do terço médio da face, obesidade e hipotonia. No período do sono, a hipotonia muscular é maior em razão de um relaxamento global, o que somado à cavidade oral menor e ao relaxamento da base da língua, promove obstrução.
É necessário incluir nestas especificidades, também, a imunodeficiência congênita na SD, que favorece a ocorrência de infecções de repetição e inflamações de estruturas como amigdalas, adenoides e tonsilas, criando barreiras à passagem natural do ar e favorecendo os eventos de apneia obstrutiva do sono. Mas há inúmeras possibilidades de solução para esta situação. Atualmente, existem diversas publicações que demostram o sucesso não só das terapias convencionais como cirurgia de remoção das amigdalas, adenoides e tonsilas, como das terapias alternativas para apneia obstrutiva em pessoas com SD, tal qual a expansão do palato, que permite uma ampliação da cavidade oral, permitindo com que a língua tenha melhor posicionamento e expandindo o caminho natural para passagem de ar da via aérea superior. Tais intervenções mostraram melhoria dos resultados neurocognitivos, comportamentais e cardiovasculares em crianças com SD. Porém, todas as intervenções só acontecerão após um diagnóstico. Como prevenção, reforçar o sistema imunológico da pessoa com SD é fundamental para evitar as inúmeras inflamações da via aérea superior. Uma boa alimentação, com redução de alimentos industrializados e principalmente excesso de açúcar, já seria um bom caminho inicial.
A pessoa que já sofreu inúmeras intervenções com antibióticos precisa recompor sua microbiota intestinal, porque as bactérias intestinais promovem grande produção de serotonina, um neurotransmissor essencial para boa qualidade do sono.
Além disso, incluir alimentos ricos em triptofano na dieta, como banana e cacau, auxilia, porque o triptofano é a matéria prima para a produção natural de serotonina e melatonina (hormônio que regula o sono).
As posturas incomuns de sono, tais como inclinação para a frente e sentado(a), ou até mais inusitadas, são fortes indícios de apneia obstrutiva em pessoas com SD. Já há estudo publicado que esclareceu a prevalência de posturas anormais de sono e suas relações com sintomas de apneia obstrutiva, como ronco, apneia testemunhada, despertar noturno e sonolência diurna excessiva (veja as referências abaixo).
É comum que as famílias relatem uma grande quantidade de horas de sono d@ filh@, mas, quantidade de horas “dormindo” não significa boa qualidade do sono. Publicações específicas demonstram que a percepção da qualidade do sono pelos familiares de pessoas com SD ainda é bastante dissonante dos resultados dos estudos do sono, concluindo que não é simples determinar a presença nem a gravidade dos distúrbios do sono apenas pela observação. (Veja nas referências abaixo)
Portanto, avaliar a qualidade do sono em pessoas com SD é essencial. Para tal fim, realizar um primeiro estudo do sono aos 4 anos de idade é primordial. Contudo, se houver sinais que apontem para problemas com sono, como irritabilidade, muita sonolência diurna, mudanças comportamentais agressivas, baixa concentração e foco, independentemente da idade é essencial realizar o estudo do sono.
Montagem de duas fotos de uma mulher jovem com Síndrome de Down. Na primeira foto em tom azul, ela olha para o seu lado direito. Na segunda, tem tom de amarelo, ela olha em direção a lente com as mãos na têmpora.
* Foto de Elizaveta Porodina para o Radical Beauty Project Modelo: Lily D. Moore
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